A Fenilcetonúria (PKU) é uma doença genética, com
herança autossômica recessiva, causada pela deficiência da enzima
hepática fenilalanina hidroxilase (FAH) que transforma a fenilalanina em tirosina. A
enzima FAH deficiente leva ao acúmulo de fenilalanina no sangue e no líquor
ocasionando neurotoxicidade, ou seja, lesões neurológicas; a dosagem de tirosina
no sangue pode estar normal ou reduzida, a qual também impacta de forma negativa no
desenvolvimento. Na urina pode ser observado o aumento da excreção de ácido
fenilacetico.
A prevalência no Brasil varia de região para região, mas de uma forma geral
é de 1:12.000 nascimentos.
As crianças nascem assintomáticas passando por um período sem
manifestações clínicas do 3º ao 6º mês de idade. A maior
complicação, relacionada ao diagnóstico tardio, sem triagem neonatal,
é a deficiência intelectual, a qual é irreversível sem tratamento
precoce. Outros sinais e sintomas são: atraso do desenvolvimento neuropsicomotor,
microcefalia, atraso da fala e da linguagem, irritabilidade, vômitos, apatia, epilepsia,
alterações de pele e cabelo (eczema, hipopigmentação),
hiperatividade, espasticidade, tremores e ataxia, depressão e outras
manifestações psiquiátricas.
A importância da Triagem Neonatal está em permitir o diagnóstico e
tratamento precoce, evitando, dessa forma, a manifestação clínica e
manifestações neurológicas que podem ser graves .
Na Triagem Neonatal, idealmente com coleta da gota de sangue neonatal entre o 3º e 5º
dia de vida, realiza-se a dosagem da fenilalanina no papel de filtro, sendo que em no caso de
confirmação diagnóstico, o tratamento deve ser iniciado até 21 dias
de vida. Toda triagem neonatal com primeiro resultado alterado, deve ser submetida rapidamente
à confirmação e repetição com testes laboratoriais bem
específicos. Ou seja, a dosagem da fenilalanina deve ser repetida e se permanecer
alterada, o paciente deverá ser acompanhado em um centro de referência do programa
de triagem neonatal.
O cofator tetrahidrobiopterina (BH4) é necessário para a atividade da FAH, e
defeitos no seu metabolismo são responsáveis por aproximadamente 2% dos casos de
Hiperfenilalaninemia devendo ser dosado para afastar a deficiência de BH4.
Além da PKU existem outras elevações da fenilalanina plasmática que
são chamadas de Hiperfenilalaninemias. A classificação é dada pela
concentração de fenilalanina no sangue, na tolerância a` fenilalanina e no
grau de deficiência da FAH (PCDT 2019):
1) FNC clássica: o paciente apresenta níveis plasmáticos de fenilalanina
acima de 20 mg/dL no diagnóstico;
2) FNC leve: o paciente apresenta níveis plasmáticos de fenilalanina entre 8 mg/dL
e 20 mg/dL no diagnóstico;
3) Hiperfenilalaninemia não-FNC: o paciente apresenta níveis plasmáticos de
fenilalanina entre 2 mg/dL e 8 mg/dL no diagnóstico;
4) Hiperfenilalaninemia transitória devido à imaturidade hepática ou
enzimática, mas que vão normalizando nos primeiros meses de vida.
Do ponto de vista do aconselhamento genético, a PKU apresenta herança
autossômica recessiva, o que significa que os pais possuem apenas uma
mutação no gene PAH, sendo heterozigotos para a condição e,
portanto, assintomáticos. Os afetados necessitam ter duas mutações no gene
PAH, sendo homozigotos para a condição. Isso confere um risco a cada
gestação de 25% de ter um filho (a) afetado (a) com FNC. O gene PAH apresenta uma
heterogeneidade genética com muitas mutações descritas na literatura. Para
fazer o diagnóstico da FNC não é necessário solicitar a
análise molecular, somente a dosagem dos níveis de fenilalanina já
serão suficientes.
A gestação nas pacientes com FNC e Hiperfenilalaninemias devem ser planejadas e
acompanhadas para alcançarem os níveis de FAL bem controlados, tendo em vista o
risco de malformações fetais. As malformações descritas em
decorrência da embriopatia pelo excesso de fenilalanina são: atraso no
desenvolvimento neuropsicomotor, déficit cognitivo, microcefalia, estrabismo, fenda
labial e palatina, anomalias vertebrais e cardiopatia congênita.
O tratamento da PKU e Hiperfenilalaninemias consiste em uma dieta restrita em fenilalanina e
deve ser iniciada rapidamente após o diagnóstico. Basicamente, compreende a
exclusão de alimentos como carne, aves, peixes, ovos e grãos com elevado teor
proteico. Não é fácil a aderência às dietas restritivas, tanto
pela limitação da ingestão dos alimentos como pelo custo de sua
aquisição, fato que frequentemente se agrava quando o paciente inicia o
convívio social. Consequentemente, o tratamento e acompanhamento devem ser
individualizados, respeitando as particularidades de cada paciente, sempre estando em alerta com
os níveis de Fenilalanina e crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor e
comportamental.
Ainda complementando o tratamento nutricional, cerca de 30% dos pacientes podem beneficiar-se ao
uso do dicloridrato de sapropterina (BH4), considerado um cofator da enzimático da PAH
que permite uma tolerância maior a ingestão de proteína. A
Indicação da Sapropterina é individualizada e o paciente deve realizar um
teste de tolerância para definir a indicação médica.
A fórmula metabólica isenta de fenilalanina é disponível a todos os
pacientes com PKU dentro do Sistema Único de saúde, contudo o BH4 (Sapropterina)
há protocolo clinico de diretriz terapêutica que define o uso para mulheres com PKU
utilizarem apenas 3 meses antes da gestação e durante o período
gestacional.
Tratamentos inovadores para melhorar a adesão, melhorar a qualidade de vida e melhorar a
tolerância a alimentos proteicos estão em estudos clínicos avançados.
Um deles é o uso da Pegvaliase que é uma enzima peguilada que converte
fenilalanina em amônia e ácido trans-cinâmico. Os níveis de
fenilalanina no sangue foram reduzidos em aproximadamente 50% a 70% em pacientes que receberam
doses terapêuticas de pegvaliase. No entanto, a maioria dos pacientes apresentou eventos
adversos.Essa medicação ainda não tem aprovação para ser
utilizada no Brasil até o momento.
Para o melhor cuidado dos indivíduos com PKU, é fundamental que uma equipe
interdisciplinar composta por profissionais da pediatria, genética médica,
nutrição, serviço social, psicologia e enfermagem estejam capacitadas para
o atendimento dos pacientes, permitindo o adequado desenvolvimento e crescimento
saudável. E não menos importante a presença da família e da
sociedade possuem papel fundamental no tratamento da PKU.
E no dia 28 de junho é o dia Internacional de Conscientização da
Fenilcetonúria, e esse dia foi escolhido devido ao nascimento de Robert Guthrie em 1916.
A PKU foi a primeira doença a ser diagnosticada pela Triagem Neonatal através do
teste do papel filtro no cartão de Guthrie.
A PKU é um exemplo de teste triagem de sucesso onde o diagnóstico e o tratamento
precoce fornece uma intervenção eficaz na mudança da história
natural da doença.
Referências:
http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2019/Relatrio_PCDT_Fenilcetonria_CP16_2019.pdf
https://www.pkuday.org/about/